Como a mulher que dança na beira do cais
Sem se importar
Com a indiferença do transatlântico mais obeso que uma nódoa
Como o mendigo que acha uma dúvida
Na lata de lixo
E decide usá-la para engraxar o sapato
Como a multidão de insetos coloridos
Ressuscitando as lâmpadas
Que a minha covardia queimou
Como os pardais que pousam nas notas apagadas
De uma partitura
Tecendo com elas o manto da manhã
Como os peixes que nadam sob as nuvens
Deixando-se pegar
Com escumadeiras de 1,99
Como os rostos em que os traços da velhice
Vão sendo desenhados
Pela charrua sabida e paciente da garoa
Como a alegria dos operários
Ao fim da greve vitoriosa
Com suas cantorias de paz e de tão manso rancor
Chegas finalmente para perfumar o meu dia
Com o sal das algas que leva em teus cabelos
De tua boca as palavras soam plácidas
Como de uma árvore velha olhando tudo desde o fim da paisagem
As sombras que se autodevoram de fome
No lado escuro da rua
Correm para se alimentar da luz
Que emana dos teus olhos tão liquidamente calmos
És linda e generosa
Como uma melhor amiga
Uma garça que com seu pé
Impede a água do lago de vazar para o bueiro
E ainda me incandesce
Com a água-viva que repousa
Serena
No lado esquerdo
Dos teus seios
De sereia
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